Inoportuna Redução de Tarifas

Processos de abertura comercial são defensáveis em situação de normalidade, quando o nível de desemprego não é tão alto como agora.

São frequentes as manifestações de autoridades da área econômica favoráveis a uma ampla redução das tarifas de importação vigentes no Mercosul, com o propósito de ampliar o grau de abertura da economia brasileira.
Trata-se de promover redução da TEC - Tarifa Externa Comum, já que o Brasil não pode, individualmente, alterar as tarifas do Mercosul. É necessário um acordo, um entendimento entre os quatro estados-membros, e no Brasil se enfatiza hoje que um processo de redução contaria com o apoio do Uruguai e do Paraguai, enquanto a Argentina estaria apresentando forte resistência.
As tarifas mais altas vigentes no Mercosul, que de fato oferecem proteção, são principalmente as referentes aos produtos industriais, em sua maior parte produzidos no Brasil e na Argentina. De modo geral contemplam setores intensivos na contratação de mão-de-obra, como confecções, calçados, automotivos, brinquedos, dentre outros.
O Uruguai e o Paraguai não contam com produção industrial relevante e suas maiores preocupações estão sempre vinculadas a exportação de produtos básicos. De longa data o Uruguai busca obter permissão no Mercosul para conduzir negociações comerciais paralelas, individuais, já que poderia ofertar redução de tarifas de produtos industriais, sem qualquer resistência interna, em troca de maior abertura para seus produtos básicos.
Já a Argentina conta com setor industrial ainda expressivo e sempre busca preservá-lo, o que é de todo defensável, especialmente neste momento de forte crise decorrente da pandemia do coronavírus.
A indústria brasileira registrou queda de 4,5% em 2020 e ainda não apresentou recuperação. Nossa produção industrial também registrou queda de 0,45 no primeiro trimestre deste ano. A pandemia acarretou severos danos a produção industrial, inclusive com o fechamento de grande número de fábricas. Muitas simplesmente encerraram suas atividades industriais ou mesmo, no caso de multinacionais, abandonaram países nos quais contavam com unidades industriais. O Brasil não foi exceção, uma vez que perdeu fabricantes internacionais, inclusive do setor automotivo, o que motivou ampliação expressiva do desemprego.
Em diferentes fóruns já se discute hoje a adoção de políticas industriais que possibilitem a recuperação do setor industrial após a pandemia. Certamente novas propostas serão debatidas, provavelmente diferentes dos modelos que foram adotados no passado. Mas é bastante razoável acreditar que sem políticas públicas dificilmente o setor industrial voltará aos níveis de produção anteriores a pandemia. Não bastará incentivar a retomada de produção de segmentos enfraquecidos, mas também instituir incentivos que permitam a reabertura de grande número de unidades industriais que encerraram suas atividades.
Em condições normais, é defensável um processo gradual de abertura da economia, já que uma maior exposição a concorrência contribui para atrair novos investimentos, para a modernização da produção, resultando em produtos mais competitivos. 
Entretanto, em um quadro de enfraquecimento do setor industrial, cuja participação no PIB é agora de apenas 11%, aliado a níveis recordes de desemprego, parece inoportuna uma discussão sobre redução de tarifas de importação, especialmente sem qualquer proposta de política industrial que possa promover novo ciclo de fortalecimento da indústria.
Ivan Ramalho

Comentários

  1. Excelente analise de uma questão que, por tão clara, nem deveria estar em discussão!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Diversificação do Comércio Exterior

A Argentina na nossa Balança Comercial

A Exportação e o Emprego